quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

O LIRIO DO CAMPO

            
                               Os bichinhos são esquisitos. Descoloridos, corpinho pequeno e extremamente ageis. Frente à visão de alguem, num piscar de olhos, desaparecem num
orificio, estrategicamente cavado, antes de se aventurarem na superficie.
A praia está cheia deles. Voce sabe como se chamam ?

                Percebeu o que fazem, quando se sentem ameaçados ? Eles vão para dentro.
A segurança está dentro.
                                          Recolher-se. Recolhecer-se para dentro de casa, da toca ou de
si mesmo. A superficie não é segura. Ela tem os seus encantos, prazeres de toda ordem,
a sua luminosidade e tantas coisas para fazer. Mas quando se trata de proteção, o negocio é se entocar.
                             Apesar do movimento para dentro ser o movimento natural, instintivo de proteção, mas quando focado para fora, ser de superficie,  esse reflexo, por falta de uso, aos poucos, perderá sua função.
E é desse modo que se cria a necessidade das coisas. Precisamos das coisas para nos sentirmos seguros A toca de proteção se transformou em toca de superficie ( toca de
superficie ? ). Se não for possivel cavar uma toca em cima, a toca virtual que
cavamos, não poderá nos proporcionar o que buscamos nela.

                  As coisas não foram feitas para desempenhar a função de guarda-costa.
Não é da natureza delas. Iremos usufruir do que o mundo tem para nos oferecer.
Iremos brincar, iremos nos divertir, tanta coisa  para aproveitar. Há a beleza das
formas para se encantar, o encontro, o abraço, as conquistas.

            Mas há tambem o sofrimento, a contração da energia, o retraimento provocado pelo medo, as angustias geradas pela busca sem fim de tanta coisa.
Se a gente for aprofundar-se um pouco, ficaremos com a impressão que o mau estar da feriferia, não é algo inerente à periferia, mas uma consequencia de como lidamos com
seus brinquedinhos, a função de segurança que lhes conferimos.
            Dito de outro modo  :  buscamos no mundo o que o mundo não pode dar.
Ele nos oferece esse espaço sem fim, a distração, a descontração, a brincadeira de toda forma com todas as formas existentes. As possibilidades são infindas.

                   Veja os cachorrinhos quando despertam. O parque de diversões já abre
suas portas bem cedo. Levantam se mordiscando, rolando um por cima do outro,
correndo, fazendo barulho, felizes, alegres. E não há stress em seu dia a dia. Quando se cansam, deitam num cantinho para refazer as energias, mas logo já estão de volta
com sua algazarra e vibração.
                                                    O que chama atenção, é que precisam de tão pouco
para serem tão felizes e encantadores. Nunca estão ressentidos, magoados, mesmo,
apos uma arte, serem repreendidos com um xingão. Sem culpa. Esquecem logo.
Aquilo já passou. Agora é outro momento, momento de brincar, de ser feliz.

                       O que foi que aconteceu com nosso cachorrinho interno, com nossa faceirice, nossa alegria e descontração ?
A necessidade de brincar, foi substituida pela necessidade de acumular.
Acumular para ter segurança. Vendemos a vida pelas coisas do mundo, por um sentimento fugaz de segurança.
                                                       O cãozinho não se sente inseguro, porque não busca segurança em nada. Não precisa de nada para estar seguro. Não é genial ?

                   Já se deu conta que a cruz é o encontro da horizontal com a vertical ?  A
cruz é o simbolo da redenção. É atraves dela que alçamos outros niveis de ordem
dentro de nós. A cruz salva, porque nos põe em contato com nossa verticalidade, com
nosso mundo interior.
                                       Aprisionado no superficial das coisas da superficie, por mais firmes que sejam as muralhas que ergueste como proteção, não te sentirás protegido.
Continuamos indefinidamente reforçando os muros, com mais sentinelas, com mais
munição.
                         Quando a segurança não for mais buscada nas nossas conquistas, nas
coisas, nosso cachorrinho interno, finalmente terá se livrado do seu cativeiro, amarrado
a uma corrente. E ficará feliz correndo e pulando por esse mundo sem fim, assim
como o passarinho, tambem, recem libertado da sua gaiola.

                                Sem problema com a superficie e com todo seu conteudo, que
é maravilhoso e divino. O problema surge quando conferimos função a algo que
não tem essa função.
                                         A realização pessoal não se fará, por apenas realizar-se no mundo da forma. Sofrimento é isso,  a necessidade da forma, da conquista como
forma de superação e segurança. Em verdade não há necessidade de nada para nos
sentirmos protegidos. Contudo, não há problema algum em ir para o mundo,
empreender, realizar, conquistar. O problema surge, e o sofrimento tambem, quando
projetamos nossa segurança nas nossas conquistas. Desse modo, nos identificaremos
com as coisas e não com o que somos. E isso é um profundo engano.

                    Vamos para o mundo como quem vai a um passeio. Mas o retorno
é necessario. É assim que se volta para casa.
E se buscamos repouso fora, não teremos descanso.

                    O medo, o desejo, a busca e a necessidade são construções mentais,
quando se faz da superficie a morada definitiva.
Isso que a cabeça nos fala não é real, apesar de poder se transformar em realidade.

            O cãocinho não tem desejo porque não tem medo de não ter.

                      E é por isso que o lirio do campo se veste com pompa
e magestade



                        

                    



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