sexta-feira, 17 de outubro de 2014

A MORTE DA CHIQUINHA


Era sua ave predileta.
Tinha-lhe, ele, entre todas, um carinho especial,
pela camaradagem criada entre ambos.

Ao dar-lhes comida a cada manhã,
vinha ela correndo de onde estivesse,
fazendo-lhe agrado,
cocoricando a seu lado,
querendo colinho.

Era sempre, para ambos,
um momento especial.
Iniciar cada novo dia, envolvido em afetos,
era sempre certeza de um dia perfeito.

A chiquinha, apesar de uma simples ave,
tinha pelo seu dono,
 - assim como ele para com ela -
um relacionamento feito de extrema ternura.

Mas, naquela manhã 
ela não veio correndo,
como era costume,
em cada encontro matinal.

Ficou apreensivo,
temendo pelo pior.
Foi então à procura,
encontrando-a despedaçada,
tendo-se transformado em alimento
para uma raposa faminta.

Juntou o que havia sobrado,
trouxe-a para junto de si,
apertou-a contra o peito,
não contendo o choro silencioso.

Ficou ali ajoelhado,
curvado até o solo,
despedindo-se da amiguinha,
que, de forma tão inesperada, virou saudade.

Naquela mesma noite, pensando apenas em vingança, 
tratou de armar a armadilha.
E, na manhã seguinte ...
lá estava ela, a raposa infeliz,
que chacinara sua avezinha camarada.

Imaginou como daria cabo dela.
Sentiu-se vingado,
e sua morte teria de ser cruel.

Olhou para ela. Estava assustada.
Foi então que percebeu,
que na arapuca, alem da malvada,
havia tambem um punhado de filhotes.

Compreendeu então, 
que o que fizera na noite passada,
tinha sido apenas a busca por alimento, 
nada alem disso,
nada alem do instinto de sobrevivencia.

E aquela ave adoravel
havia cumprido os designios
dos preceitos da natureza.

Levou então a armadilha,
com a raposa e seus filhotes
para uma mata distante, em segurança.

Enquanto desaparecia por entre os arbustos,
desejou-lhe boa sorte,
livre das armadilhas da vida.

Estava emocionado.
A avezinha não estava mais aí.
A raposa, ao menos essa, estava feliz
juntamente com seus filhotinhos.

É assim que a vida é.
Nada a lamentar.
Da chiquinha ficou a saudade,
e a vida segue em frente,
assim como a vida tem de ser.

   







domingo, 5 de outubro de 2014

AS PALAVRAS


Há palavras que encantam, que norteiam,
outras, perturbam, desorientam.

Há as palavras que engrandecem,
assim como aquelas que destroem.

A palavra pode trazer a paz,
a outra, pode fazer a guerra.

Podem elas fascinar, seduzir, cativar,
ao mesmo tempo rejeitar, intimidar, desencantar.

De certa forma, tudo passa pela palavra.
E é por isso que é exaltada
pelo seu fascinante poder.

Cria malquerenças,
mas desperta tambem paixões memoraveis.

Seu genio é rigorosamente paradoxal :
o poder com que destroi,
está alem da baioneta ou dos canhões.
Porem a virtude do perdão tambem lhe é peculiar,
quanto levar conforto onde há sofrimento.

É por isso que o silencio é ouro,
ainda mais na ausencia da palavra pertinente.
Palavra mal dita,
é sempre uma palavra maldita.

sábado, 4 de outubro de 2014

O VELHO ALBUM


Tive sempre cá comigo,
que o passado é uma forma de sombra,
uma sombra que se estende sobre o presente,
qual nuvem no firmamento,
escondendo a luminosidade do dia.

A sombra pode até trazer frieza,
a indiferença, a apatia, o desanimo,
um certo ar de tristeza
pelo calor do entusiasmo que se desfez.

Pode a sombra, todavia, ser refrescante,
um jeitinho de conforto,
ante a intensidade do mormaço.

De qualquer forma, é sempre agradavel
serem festivas as lembranças a rememorar. 

O tempo passou,
e com ele tanta coisa ficou para tras.
Vivemos historias ...
quantas historias de amor !
Conquistas emocionadas, festivas, solenes,
na primeira curva do tempo, porem,
transformaram-se em folhas mortas
carregadas pelo vento frio do outono.

Mesmo assim as imagens ficaram retidas
num velho album amarelado,
guardado no fundo de uma gaveta.

As lembranças persistem,
flutuam no ar,
 - meros devaneios -
como sombras fantasiadas de realidade.

Resulta em saudades remexer o velho album,
qual caixinha nostalgica,
cantinho de melancolia,
imagens perdidas de um tempo que vai longe. 

Assim, é bom que o velho album não se perca,
conserva o passado,
que nem sempre fazemos questão seja perdido.