sexta-feira, 31 de maio de 2013

QUANDO O POSTE É O CULPADO


   O poste estava verdadeiramente surpreso, confuso, ante a acusação de que estava sendo alvo. 
A queixa do motorista era veemente e parecia de todo justificada. Se o poste não estivesse aí, naquele momento,
não teria havido acidente. Por dedução logica, o poste é culpado.
E esse foi o veredicto do magistrado.

A culpa é sempre do poste !
Eu acho, voce acha, ele tambem acha, enfim nós todos achamos
que o poste é sempre o culpado.

É sempre mais facil culpar que tornarmo-nos responsaveis por 
nossas coisas. Quem assumir a responsabilidade por seu mundo interno, não sentir-se-á jamais injustiçado ou incompreendido.
Está vigilante, e já terá alcançado a compreensão que atraimos sempre conforme sente o coração
Os que clamam por justiça, mal sabem que já foi feita.
Não há inocentes, tambem não há culpados.
E quanto a injustiça, será que ela existe ?  Se houvesse,
a vida, certamente, não seria justa.

Atraimos por similitude mental. É a lei da manifestação.
E exasperar-se ante seus efeitos, é a forma mais ingenua de achar
que somos vitimas inocentes - e o clamor por justiça
pressupõe sempre culpados.

"De tudo que tiverdes medo, é isso que vos sucederá".

De quem é afinal a responsabilidade por tudo que acontece,
bom ou ruim, na vida de todos nós ?

E, quando os culpados, por fim, tiverem sido devidamente condenados,
o suposto mal de que fomos vitimas, como
 nos será restituido ?
Qual a parte de nós que satisfaz-se pela condenação do culpado ?
Não seria talvez exatamente a parte que não assume a responsabilidade por tudo aquilo que atrai ? Não é essa  parte que se lança em cruzadas desatinadas à cata de culpados por tudo que
existe fora de orbita em sua vida ?

A parte que culpa é o lado infantil que ainda não cresceu, não
transformou-se em adulto, ainda acostumado a gritar por socorro,
esperando por papai para ser salvo.

Quanto mais necessitarmos de postes  nos quais colocar
culpa, como bodes de expiação, estamos apenas justificando a irresponsabilidade infantil, patetica, que reflete o nivel
 de evolução, e
a verdadeira idade dentro da qual cada um vive.

Que seria do mundo sem tantos postes onde esconder tanta
imaturidade de gente grande que esqueceu de crescer ! 


terça-feira, 28 de maio de 2013

ATIVIDADE FISICA É ATO FISIOLOGICO


Fazemos analise, consultamos gurus, pais de santo,
 falsos profetas,
buscando amparo em toda forma de sortilegios,
tudo para sentirmo-nos bem, ter saude, encontrar a paz, que
não falte dinheiro, que o companheiro volte, e quanta coisa mais.

Caminha ! "Move-te" !
 Não fique aí sentado, lamentando-se da sorte,
esperando encontrar consolo, ou saida nesse canto funebre de
infortunios e desgraceira, ou então ser favorecido pelos deuses do
olimpo, ou, quem sabe, por um despacho de coisa-feita.

A indolencia do corpo tem dessas traquinices. Ao que não se mexe, 
terá que ir a Caravaggio mais tarde, não pelo gosto do caminhar,
mas como forma de penitencia, ou então suplicando benesses e
piedade da santa milagreira. 
Esperamos sempre sermos salvos por tudo não feito
por nós mesmos. É proprio da negligencia e da malandragem.

Espirito sem dinamismo, sem energia, cria toda forma de
 penuria e sofrimento, não havendo ponte de safena
 ou fluoxetina que consiga dar jeito - apesar de, bem no fundo,
no mais das vezes, acreditarmos ser isso possivel.

Pobre vida essa vivida sem animo, inspiração ou entusiasmo,
onde o corpo aos poucos deforma, enfeia, engorda, 
cheirando mal, e o espirito murcha, fenece, assim como a
chama, quando a vela acaba na ultima gota de cera.

A desistencia da vida começa pelo corpo, pois como
estar de bom animo, quando a carne arruina-se sob o efeito da
fadiga, e o barulho na cabeça, que nem exorcista consegue
silenciar ?

Afora a ignorancia, a inercia completa o espaço dentro do qual
desdobra-se toda a desgracez humana. Onde há sofrimento
impera uma ou outra. Geralmente ambas.

As trevas cedem tão somente à luz. Não havendo atalhos
 por onde safar-se em busca de simplificação ou facilidade.

Antes de ir ao confessionario, pedindo perdão dos 
pecados, não perca tempo com sandices. Vá caminhar !
Os deuses de todas as tribos tem boa vontade com quem 
tem boa vontade com seu corpo.

Não permita o corpo esbagaçar-se a ponto de depender
da ajuda, ou da boa vontade dos outros.
Terá de aguentar o tranco. Irá então dar-se conta que
é mais divertido cuidar-se a si mesmo, fazendo,
a cada momento, o que tem de ser feito, não transformando
 a vida num canteiro de obras, empreitando saude
e felicidade.

Atividade fisica tem equivalencia com ato fisiologico. Se
alimentar-se diariamente é importante, de igual forma
sacudir o corpo reveste-se da mesma importancia. Agua 
parada acaba sempre cheirando mal.

Espiritualizar-se sem cuidar do corpo, reflete o total desconhecimento da lei da polaridade.
 Somos como uma porta onde num dos lados se lê  "entrar", e no outro "sair". A porta é a mesma, dependendo apenas de que lado olhamos para ela.

Os aspectos fisico e espiritual complementam e ajustam-se como mão e luva. A espiritualizacão torna-se improvavel sem a
dedicação diligente e responsavel para com
 esse corpinho sagrado.

Com o corpo assim, desse jeito, parecendo uma favela, sem
entusiasmo, nem leveza de espirito - faz apenas aumentar o coro
dos que consideram vida um verdadeiro inferno.
Para esses, certamente, não é mais que isso. 





  

sábado, 25 de maio de 2013

ONDE FOI O TEMPO PARA SER FELIZ ?



Voce, acaso, faz ideia onde foi o tempo quando a gente
sentava na calçada, com a porta aberta,
 ao final de cada dia ?

Havia tempo para nos olharmos, para nos sentirmos e
 sabermos de nós mesmos.
 Sabermos um do outro.
Falar e ser ouvido. Olhar e tambem ser visto.

Esse mundo simples e singelo,
 feito da pureza e magia do momento,
 dessa presença unica, serena, inocente,
presença feito alegria,
voce sabe para onde foi ?

Um tempo sem pressa,
quando ainda não havia muros, nem grades,
nas janelas havia flores,
e nas portas, um lembrete de "seja bem vindo".

Quando foi que nos tornamos estranhos,
perdidos de nós mesmos,
como forasteiros num mundo desconhecido ?

Bem desconfio, que voce tambem não saiba
onde foi esse tempo,
quando se tinha tempo para ser feliz.

Teu olhar comunica melancolia,
um quê de saudade,
 como quem fica surpreso,
com dificuldade para entender.

Já que ninguem sabe,
nem compreende o que houve,
 talvez queira vir comigo, 
e sairmos a procurar por aí,
atrás das arvores, embaixo das pedras, ou na ultima saudade.
Quem sabe, tenha apenas se escondido.
Talvez não tenha ido embora,
assim como quem não volta mais.

Esse tempo para ser feliz
ainda deve estar por aí.
Apesar das portas fechadas, 
do dialogo que silenciou,
do olhar que já não percebe,
e do coração que não sente mais.

Se o encontrar de volta, eu te avisarei.
Fará o mesmo comigo ?

quinta-feira, 23 de maio de 2013

A NEBLINA NUMA MANHÃ DE FERIADO NACIONAL


A nevoa não havia ainda se dissipado de todo. A visibilidade era
imprecisa, e tudo era visto de uma perspectiva estranha como em  
outra dimensão, não correspondendo à realidade.

As imagens pareciam arbitrarias, sem formas definidas, como se
fossem fantasmas, ilusões de otica delicadamente elaboradas pela bruma compacta, umida e fria.
Era como uma nuvem gigante que tivesse repentinamente se
apossado da atmosfera, transformando tudo na mesma natureza eterea e incerta do espaço nebuloso. 
A paisagem remetia a um filme antigo, em preto e branco,
 cujo enredo reportasse a coisas de saudade, lembranças de um outro tempo.

Os raios de sol timidamente infiltravam-se atraves da cortina umida, onde a nevoa era menos densa, produzindo uma lumiosidade poetica, uma atmosfera de fascinio e encantamento. 
Tinha-se a sensação de ser transportado para uma outra
circunstancia, como se fosse um vazio de tempo, uma lacuna entre
dois silencios,onde tudo era estranho, desconhecido, sem,
no entanto, deixar de produzir um sentimento extase e arrebatamento.

Visão que impõe reverencia, como um cerimonial sagrado,
por seu encanto singular, pelo que sensibiliza o espirito,
criando um espaço de ternura e enlevo, tão distante dos momentos
iguais de todo dia, com seu rigor austero, efeito dos discursos
incessantes de preocupação e medo dentro da cabeça.

Os dias cinzentos de nuvens baixas sempre foram de
 fascinio e sedução sobre meu espirito; um convite para trazer o olhar para mais perto, ao inves de mirar à distancia, que a luminosidade possibilita, e voltar-se para dentro, espaço mormente às escuras, e de poucas visitas.

Entendo que seja por isso os dias de nevoa baixa, de pouca
visibilidade externa, para a atenção voltar-se para dentro,
a gente encontrar-se com a gente mesmo, compania sempre
feliz, mas de raro e dificil acesso.

Encontrar-se a si proprio, à luz e ruido do mundo, ante os estimulos
e requisições de toda ordem, é tarefa pouco estimulante para
quem quer que seja. Soltar-se do mundo parece voltar-se para
coisas sem relevancia, pois a atenção volta-se apenas para os temas
 do dia a dia, o habitual de sempre, compromissos, preocupações.

Enquanto procurarmos significado nas coisas, estaremos num
mundo de sombra, onde não há sentido nem significado. Estar
perdido é isso. Tentar encontrar-se atraves de conceitos, 
da racionalização da mente, que impõe como objetivo
supremo a coisificação da vida.

A neblina aos poucos cedia à insistencia do sol, que começava 
a produzir uma sensação agradavel de aconchego e calor
estimulante.
Foi então que percebi uma porta aberta e um homem sentado
no ultimo degrau da escada lendo seu jornal matinal. A cena era quase invisivel, vista à distancia, pois a nevoa não havia ainda de todo dissipado, e o sol iluminando atraves do espaço neblinoso, não
permitia clareza à visão, nem ao entendimento.
Deitado aos pés do homem que lia, um cãozinho peludo,
enrolado em si mesmo, no conforto do seu sono e aconchego da
compania.
Parecia macio, sem osso, todo feito de algodão. Uma bolotinha de
lã. Parecia feliz por estar aí, deitado aos pés do seu cuidador,
banhado pelo sol caloroso, nessa manhã de feriado nacional.

A cena era silenciosa, e vista à distancia, atraves da neblina ensolarada, tornava-se quase invisivel. Mas dela emergia
encanto e magia, um sentimento de ternura e delicadeza, que momentos especiais, de rara beleza nos proporcionam.
Se tivesse o dom do pincel, plantaria aí meu cavalete e daria
forma artistica à cena comovente. Certamente, se transformaria a pintura em poema de rima perfeita.

O homem lia as ultimas noticias das tragedias do mundo e 
inquietações dos homens, enquanto o cãozinho, enroladinho,
talvez sonhasse com realidades menos confusas, com um
mundo menos sofrido.
 Quem sabe, haveria flores e estrelas no
seu sonho, bem diferente das noticias tragicas do jornal matutino.

 Sentado no ultimo degrau da escada, não foi a beleza e magia
do momento que tocaram a sensibilidade do homem. Mais importante que a graça e o encanto da paisagem, nessa manhã 
admiravel de feriado nacional, feita de bruma, saudade e recolhimento interior, foi olhar para fora, para o sofrimento do
mundo atraves das paginas do diario da manhã.  

Enquanto isso, alheio a tudo, o cãozinho macio, algodoado,
continuava no seu sonho feito de flores, estrelas e magia.





   



sábado, 18 de maio de 2013

ESTOU NO FACE BOOK


                  Estive ausente, por alguns dias, desse cantinho agradavel,
para adaptar-me às coisas do facebook.
  Novas experiencias levam sempre a vivencias diferentes. É
interessante compartilhar ideias, expor-se atraves de pontos
de vista onde as pessoas reagem de pronto. 
As proprias postagens, veiculadas tambem por aquele canal, atingem um outro grupo de pessoas, fazendo eco num espaço maior.
Aqui no blogger, escondido no meu cantinho, não há essa interação
instantanea como a que acontece lá. 
No inicio resisti, mas a ideia, sem duvida, é interessante.
Sou de natureza mais solitaria, que se adapta bem às coisas daqui.
No face a interação é mais dinamica. Pessoas chegam de todo canto, umas para dizerem apenas um olá, outras para curtirem as
colocações, ou para um bate papo virtual.
Isso tudo tem a ver com abertura de novos horizontes, ou então,
olhar a vida atraves de outras janelas. E outras janelas mostram
outros panoramas, outras paisagens, diferentes daquelas a que
nos acostumamos, ou por comodismo, ou mesmo por
simples opção.
E o bom disso, é que podemos sempre escolher novamente.
Afinal, sem abrir-se para novas realidades ficamos 
bitolados, restritos a uma visão unilateral, perdendo a beleza
da abrangencia de um olhar mais amplo.
Enfim, estou cá e lá, pingue-pongue tanto de relacionamento
como no ambito das ideias.
Assim,quem quiser seguir-me tambem pela banda de lá,
 seja bem vindo e boa convivencia.


















































































































































































































































































































































quinta-feira, 9 de maio de 2013

OUVIMOS DEUS QUANDO OLHAMOS SEM O PENSAMENTO


As manhãs de caminhada são sempre excelente exercicio para a
pratica da observação cuidadosa. 
Acalmando o alvoroço habitual da mente, o olhar aguça-se e, de
forma singular, a percepção se aprimora.
 A inquietação na cabeça, que não cessa um instante sequer, impõe-nos uma visão à margem da realidade. Seu estimulo é de tal forma envolvente e intenso, que, atraves de manobras astutas, qual mestre ilucionista, mantem controle absoluto, impondo uma
visão falsa, determinada pelo enredo mental involuntario, como simples reflexo condicionado. Isto é, pensamento automatico. Pensamento sem dono, que se faz por si proprio, à margem
da nossa vontade.
A visão do que vemos, não é definida, portanto, pela imagem captada visualmente, mas pelo conceito emitido, em forma de pensamento, sobre aquilo.

É como assistirmos a um filme, e aquilo que vemos, não serem
 as imagens projetadas na tela, mas as imagens mentais imaginadas,
a partir daquelas, e projetadas na tela da nossa consciencia.
Vemos o que pensamos, enquanto olhamos. Vemos a ideia que
fazemos daquilo. A visão não tem soberania, no tempo em que 
estiver sob o efeito do falatorio interno. Enxergamos por dedução,
por abstração, e não como um fato real em si.
 Sobrepõe-se à imagem real - aquilo que está aí -  a imagem sugerida pelo dialogo
 mental, e essa resultante será percebida como real.
Transformamos, dessa forma, o mundo real - atraves da
argumentação da cabeça - num mundo de quimeras e ilusões
  fantasiosas.

Até podemos olhar para as coisas, enquanto passamos, no entanto,
não vemos a coisa em si, à medida que pensamos sobre aquilo. A
percepção fica distorcida atraves do filtro da manipulação mental.
O olho capta, mas a mente reinterpreta a visão, dando-lhe um
sentido que se adapta ao seu modelo de realidade, de como imagina
que as coisas deveriam ser.

E foi numa dessas que a coisa me pegou. 
O pit bull branco era compania constante nas minhas manhãs de
caminhada. Via-o por aí, correndo por todos os lados, 
 atraido pelas lixeiras, em busca do seu desjejum.
Encontrava uma coisinha ali, outra acolá, e seguia em frente, com
a cauda sempre empinada, orelinhas atentas, sem importar-se, aparentemente, com o mundo ao seu redor. Repetia, dessa maneira, seu ritual de todas as manhãs, parecendo feliz, alheio à sua situação  desfavorecida.

Passou por mim correndo, como
de costume, mas algo estranho, nesse momento, tomou conta do meu ser.
 Pela primeira vez eu o vi verdadeiramente. E uma emoção
comovente tomou conta de mim.
Não o vi atraves de uma ideia, como normalmente fazemos, quando
olhamos para qualquer coisa. Já temos uma ideia pré-formada
do mundo que nos rodeia. Ao olharmos para uma flor, imediatamente a flor é transformada naquilo que conhecemos
sobre flores. Se for uma rosa, a flor será transformada em
 rosa-ideia e nada mais.
 Com isso perde-se a essencia. Vemos o nome daquilo que
é visto, pois a imagem real ficou retida no filtro das coisas conhecidas.
Ficou na mente. Vemos o pensamento da coisa e não a coisa em si,
abstraida de qualquer comentario da cabeça.
Vemos uma ideia. A visão ficou retida nas malhas do racional, não
transformando-se em sentimento. Não chegou ao coração.
Vemos, mas não sentimos.

Sempre nos viamos, todas as manhãs, como dois personagens 
estranhos, presentes no mesmo ambiente, seguindo os mesmos caminhos, mas diferentes nos seus propositos.
Eu, cuidando da minha creatinina, ele, do seu estomago reclamando
por algum alimento.

Quando passou por mim, olhou-me à maneira como os amigos,
quando se encontram, e tive a nitida sensação de
ter-me saudado com um gentil bom dia. Fez até leve 
reverencia com a cabeça, como quem levanta o chapeu em
sinal de saudação. Não usava chapeu, certamente, mas seu cumprimento deu-me a sensação de ter visto um chapeuzinho invisivel me saudando. Num impulso automatico, levei a mão ao meu boné,
e retribui-lhe o gesto cavalheiro, inclinando, da mesma forma, levemente a cabeça. 
Foi um instante de comovente ternura, encontro de dois corações, reverenciando a vida num encontro verdadeiro, naquilo que há
de mais sagrado na vida.

 Não seria o amor algo semelhante a isso ?
Faço ideia que sim, pois tive um profundo sentimento de respeito
e afeto por aquele bichinho encantador. Acho que sentiu o mesmo. Talvez nunca ninguem antes deve ter-lhe inclinado a cabeça em
sinal de saudação reverente, com um leve toque no boné.
Ficamos amigos. Amigos inesqueciveis. Amigos de coração.

 O que chamou-me a atenção, foi que a fome não impediu-o de ser fidalgo e demonstrar dignidade. Não lastimou-se da sorte, nem
mendigou piedade. Aceitou dignamenmte seu destino e estava fazendo o que tinha de ser feito dentro das suas circunstancia, naquele momento.

Não tinha aspecto de quem estivesse triste, ou inconformado
 com sua sina.
Ficou feliz ao me ver, pois reconheceu-me -  velho conhecido das manhãs de caminhada.
Será que imaginou, que eu estivesse tambem, como ele, procurando algo com que alimentar-me, e tenha sido por isso que desejou-me, tão gentilemente, na sua saudação reverente, que tivesse um dia de sorte ?

Fosse como fosse, sua energia tocou-me profundamente. Amei sua maneira de como conduzir a vida. Um serzinho valente, alegre,
de bom animo, apesar de abandonado à
sua propria sorte. A vida, contudo, não o havia abandonado.
Talvez tenha se dado conta disso, pois não entregou-se ao desanimo ou ao inconformismo sem esperança. 
  Talvez esteja aí o segredo da boa fortuna. O desanimo da alma cria a desventura e toda sorte de infortunios na vida. 

 Estava até gordinho, de porte elegante, altivo, gracioso,
 dando a entender que encontrava sempre, em todas as manhãs, nos lixões do mundo, algo com que saciar sua fome.

Trazia uma coleira amarrado ao pescoço, sinal que um dia já teve dono, alguem que se importasse, alguem
que lhe tivesse dado amor. Agora, porem, os tempos eram outros, e ao inves do amparo e cuidados de alguem, estava sendo guiado pelo
 instinto - outra forma de proteção e segurança, definida de forma natural, às espensas de forças superiores, proteção incondicional.
 E, pelo visto, até o momento, tudo estava bem.

Ainda o vi, quando dobrou a esquina, endereço talvez 
da proxima tentativa de encontrar algum alimento. 
Fiquei feliz com aquele encontro. A alma do bichinho fez
contato e despertou minha sensibilidade. Senti-me um pouco
mais humano por ter sentido amor verdadeiro por um
pit bull abandonado, nessa manhã de caminhada.
Emocionei-me, como há tempo não acontecia, com sua saudação
reverente, desejando-me sinceramente um dia feliz.
Senti que ele, da sua parte, tambem ficou tocado, talvez por
ter sido, pela primeira vez, que alguem o percebesse de mente
vazia, sem julgamentos de valor, ou criticismos da racionalidade.

Ver, abstraido do dialogo confuso da cabeça, leva-nos a ver
com o coração. E quando o coração vê, compreendemos que
a vida é mais do que os olhos conseguem mostrar, e bem mais
do que as ideias nos fazem acreditar.

Ouvimos Deus quando olhamos sem o pensamento.



sexta-feira, 3 de maio de 2013

AS PALAVRAS, O SILENCIO E A SAUDADE


 Queria dizer tantas coisas,
tantas coisas imaginei, quando fossemos enfim nos encontrar,
sentados à sombra do velho pinheiro da montanha,
à sombra das suas infindaveis recordações.

Mas voce passou, passou tão rapido,
 que não percebeu meu abano, minha agitação,
 nem deu-se conta da minha presença.
Voce não me viu enquanto te vi passar, e sumir à distancia,
como se nada tivesse acontecido. 

Fique então com minhas palavras não ditas, tão cuidadosamente escolhidas, por tanto tempo acalentadas, que, prontamente, transformaram-se em silencio, em algo que perdeu a graça. 
O que era repleto e perfeito simplesmente esvaziou, 
sumindo nas voltas e na poeira do caminho.

Voce passou linda. Ornada de alegria e juventude,
com olhos de confiança, de quem não conhece limites. 
No entanto, teus olhos não me encontraram,
voce não me viu, enquanto
passou tão linda. Fiz de tudo, mas foi tudo em vão.

Então lembrei-me das palavras que não foram ditas,
tão bem guardadas com tanto cuidado,  
 que até poderiam num lindo poema ter-se transformado,
 ou numa canção alegre para cantar.
Nesse momento, as repeti em silencio, para mim mesmo,
apenas para experimentar seu efeito.

Fui embora. Já não havia mais ninguem, mas o som das
palavras, entoadas em silencio, sem pressa, nem ansiedade,
 ecoavam em meu ser.
 Parecia possuido pela graça e o encanto do encontro que não aconteceu. 
Fiquei emocionado por tantas palavras simples, mas tão genuinamente verdadeiras, carregadas com tanta emoção.
Mas entristeceu-me o fato de não haver ninguem 
que as pudesse escutar, e sentir seu fascinio.

A mesa estava posta. O ambiente era perfeito.
 Cuidei de tantos pequenos detalhes. Nada poderia comprometer.  As flores proprias para o momento, a meia luz, num tom azulado,
 a musica suave, docemente envolvente, 
 a atmosfera estimulada com toque sutil de alfazema.
 Perfeito. Mas as cadeiras ficaram vazias, e o ambiente permaneceu
em silencio.  Tristemente silencioso, frio, carregado de saudade.

Apesar disso tudo, consolou-me o fato que nem todos os encontros
possiveis se tornam possiveis, de igual forma, nem todo o encanto da palavra transforma-se em poema para ser reverenciado.
Há sempre magia no silencio, mesmo que venha todo cheinho
de saudade.